quinta-feira, 28 de maio de 2009

GRUPO FOLCLÓRICO ETNOGRÁFICO

MEMÓRIA DESCRITVA

Refere-se a presente a uma casa antiga pequena situada na Fonte da Ribeirinha, com uma cozinha com forno, sala e um quarto com mobiliário antigo. Junto da casa encontra-se uma despensa onde está um tear com mais de 100 anos, sendo considerado um dos mais antigos teares caseiros da Ilha Terceira e todos os seus utensílios, ao lado está o curral das galinhas, do outro lado ao fundo do quintal encontra-se a burra de milho, o curral do porco e o das ovelhas e ainda o Coura doiro.
Nesta casa morava uma família conhecida por “Violantes”, era uma casa onde todos trabalhavam na tecelagem, era deste ofício que esta gente vivia. Nesta casa está um dos teares mais antigos da Ilha Terceira e todos os utensílios que pertencem a este ofício
Nesta casa já não vive ninguém e está em estado muito degradado, sou familiar desta família e tinha muita honra em reconstrui-la, fazendo dela um pequeno museu e que todos os emigrantes, turistas e população em geral tenham a oportunidade de visita-la, porque foi aqui que se fabricaram das mais bonitas e coloridas colchas de tear, muitas mantas, saias de ombros e fatos de lã de ovelha.

O TEAR E A INDÚSTRIA DA TECELAGEM

Pela sua antiguidade, pelo seu valor artístico, abundância de decorações e técnica, a tecelagem é a primeira das indústrias terceirences.
Há uns anos a trás podia-se facilmente distinguir as pessoas rurais, os nossos “homens e mulheres do monte”, bastando para tal, olhar para o trajar.
E isto porque enquanto a “gente do monte” usava as suas “vestimentas” de trabalho e domingueiras, e até roupa interior, com panos fabricados no tear caseiro, os da cidade vestiam-se com finos tecidos nacionais, ingleses ou bretões, trazidos pelos mercadores que aqui acorriam na segunda metade do séc. XVI, para trocar as suas mercadorias, com as riquezas transportadas nos bojos das Urcas inglesas, Galeões da Flandres e da Espanha, das Caravelas da Escócia e das Naus vindas da Índia, acoitadas à protecção da então criada Provedoria das Armadas Reais e da Fazenda.
A tradição da tecelagem na Terceira remonta ao período do povoamento, quando a subsistência familiar dependia da produção dos tecidos de lã e linho necessários ao vestuário.
Nos séculos XVII e XVIII, os casais Açorianos, idos para o Brasil, levaram consigo e aí prosperou. A tecelagem é uma actividade muito antiga desde sempre ligada à actividade doméstica, desenvolvida predominadamente pelo sexo feminino, complementada com a fiação da lã e do linho e também utilizando trapos velhos como matéria-prima.
A tecelagem é a fase final de um ciclo que começa com a tosquia e a colheita do linho e termina com a fiação da lã e do linho, passando ambos anteriormente por várias fases.
Na tecelagem tradicional, os gestos e as sequências testemunham o trabalho colectivo que permitiu seleccionar e transmitir de geração em geração os modos de fazer mais apropriados, de melhor efeito, de mais belos padrões. Nas longas sequências de tarefas com que a tecedeira tem de tratar a lã para chegar ao fio perpassa, indelével, o fio da memória que atravessa gerações unindo-as pela aprendizagem, tal como, em cada ciclo de vida, se reafirma os processos de lidar com o meio e com aquilo que é por ele posto à disposição dos que nele habitam. Quando a subsistência familiar dependia da produção dos tecidos de lã e linho necessários ao vestuário. A utilização dos velhos e pesados teares ainda se mantém na produção das colchas de lã de cores matizadas e com motivos geométricos, amplamente utilizadas por toda a ilha, a cobrirem as camas e também a enfeitarem as janelas em dia de festa.
Uma das manifestações mais características do artesanato dos Açores – as colchas de tear, também chamadas "colchas de ponto alto". De um colorido intenso, onde prevalece o vermelho e o amarelo, as "colchas de ponto alto" são um mosaico de quadrados e rectângulos que cobre todo o tecido, laboriosamente realizadas em toscos teares de madeira, usando técnicas ancestrais.
Feitas de quente lã para abrigar do frio nos dias de Inverno, são uma nota de cor que alegra os quartos singelos, de paredes caiadas. A tecelagem manual na Terceira é de uma riqueza patrimonial de significado incalculável.
As colchas trabalhadas no tear com a paciência minuciosa de muitas horas de pequeníssimos punhados de perfeitos efeitos de linha, são a meu ver, as peças mais belas e ricas deste artesanato. Contudo, os tapetes, os conjuntos de panos, as passadeiras e carpetes coloridas, são uma riqueza a não perder nunca.
É preciso preservar este património.
Em alguns lugares da ilha, encontramos a tecedeira artesã isolada, ou de parceria com uma companheira. Utilizam um tear rudimentar manual, instalado no seu próprio domicílio. Para além do tear, há ainda a destacar alguns instrumentos que embora não fazendo parte dele, intervêm de modo significativo na execução das tarefas preliminares da tecelagem, a dobadoira, o caneleiro, o Restelo, a urdideira, e a espadilha.
As mantas de trapos feitas em teares utilizam tiras finas de tecidos de várias cores. Além da lã e do linho também se utilizava os trapos. Os trapos eram feitos de roupas que já não se utilizavam, eram cortados em tiras e unidos por um alinhavo, com o qual se teciam mantas e tapetes.
Na confecção de tapetes são utilizados fios de algodão, (antigamente era utilizado o linho ou a estopa) que se apresentam enrolados em meadas, estas vão depois ao tear, urdindo a teia, que serve de “suporte” ao tapete.
Ao mesmo tempo utilizam-se farrapinhos, que são cortados finos, de roupas e tecidos velhos, de modo a que o tapete fique mais perfeito. Estes farrapos são emendados e enrolados em novelos, que são depois entrelaçados na teia, e são eles que vão dar as mais diversas cores aos tapetes.
No tear trabalha-se com os pés, fazendo levantar os liços, passando os farrapinhos por entre os liços e o pente, bate-se depois bem o pente com as mãos, tornando o tapete mais compacto. A mesma operação é repetida trocando de pé, voltando a passar o farrapinho, e batendo-se novamente o pente. Estes gestos são repetidos, até dar a medida (comprimento) pretendida ao tapete. Este pode sair com franja, deixando uma parte da teia, ou pode, no fim de sair do tear, alinhava-se ficando assim sem franja.
Os tapetes assim feitos eram usados antigamente apenas em casas ricas. Hoje usam-se no chão como carpete, nas camas de ferro e até como cortinados. Para fazer as mantas de trapos, que antigamente eram usadas nas camas como cobertores, cozem-se duas destas peças, obtendo-se assim o cobertor.

O TEAR

O Tear é inteiramente feito de madeira com paus rústicos, lisos e lustrados pelo uso, numa armação tosca e rudimentaríssima. Quatro paus dispostos ao alto, a partir do chão, dois de um lado e dois do outro, a iguais distâncias, prendem-se no topo a um rectângulo formado de barrotes sobre os quais assentam três réguas atravessadas a iguais distância às quais dão o nome de travessas.
De cada lado, relativamente a quem trabalha, os quatro paus perpendiculares, acima referidos, estão ligados por dois barrotes, um de cada lado a que dão o nome de mesas e fazendo ângulo recto com estes, por mais dois paus facetados, que giram sobre si mesmos quando movidos pela tecedeira, aos quais dão o nome de órgãos.
O trabalho com o tear manual e seus elementos nos ensina a paciência, o respeito às suas características, a estar presente aqui e agora, sempre trazendo a consciência para o trabalho desenvolvido nele. Basta ter um pouco de sensibilidade para perceber que um trabalho feito à mão, com criatividade, usando materiais naturais, com simplicidade; nos mostra vida, energia.
E quando temos a oportunidade de trabalhar com um material desde a sua origem, como por exemplo a lã, o algodão, o linho processa-los e torna-los úteis ao uso é um processo muito rico de se vivenciar, pois todo ele é vivo, é movimento e transformação,
Isto é vida e por isso é terapêutico. Antigamente, estas práticas faziam parte da vida das pessoas e hoje tornou-se algo muito distante, como “hobby”, terapia, passa-tempo, modas exóticas às vezes, e outras coisas.
O tear é o nome de um artefacto que utiliza um mecanismo para produzir um tecido a partir de fios. Um tear serve para colocar uma quantidade de fios e mantê-los tensos; este grupo de fios se chama urdume. Logo, se utiliza outra função do tear para tecer a trama no urdume já tenciona.
A máquina que vamos utilizar é de madeira e é mais uma ferramenta do que uma verdadeira máquina. Pouco a pouco se converterá em um amigo que nos pode proporcionar muita alegria por nosso trabalho.
O termo tear engloba muitas coisas. Dado que tecer é formar uma tela com trama e urdume, nos encontramos com um significado bem definido.
O tear artesanal pode produzir tecidos desde os mais grossos até os mais finos, desde as pesadas mantas de lã até os finos tecidos de seda, porém sempre se trata de tecer uma trama em um urdume previamente colocado sobre o tear.
O jeito de poder trabalhar horizontalmente ou verticalmente dá lugar aos tipos diferentes de teares.

Um tear pode ser algo muito rústico: pode improvisar-se com um par de paus no chão, ou com uma moldura muito simples, ou com um cinturão com um par de varinhas, e também se pode aproveitar os galhos de uma árvore ou um batente de uma porta.
Porém, por mais simples que seja, só se pode chamar tear algo provido de um mecanismo para separar os fios do urdume e deixar passar o fio da trama. Assim o urdume se abre, se divide em duas partes iguais, deixando bastante espaço para passar o fio da trama. Esse espaço entre os dois grupos de fios do urdume se chama cala
Conforme descreve Virgílio Várzea, em seu livro “Santa Catarina, A Ilha”:
“...O aparelho era todo de madeira e compunha-se de uma armação rectangular de 2,20m de comprimento por 1,80m de altura, dividida em duas partes – uma imóvel e outra móvel. A imóvel, também chamada varal, era formada por quatro moirões ou colunas fincadas no chão sobre duas travessas laterais, com duas outras paralelas a altura de 80cm, e ainda duas outras no alto, fechando e reforçando o aparelho para que este resistisse ao bater rígido e contínuo do pente, durante a sua utilização.
Na parte imóvel, a cada cabeceira, há um cilindro – o da frente e onde se enrola a teia à proporção que é manufacturada, tendo para isso uma manivela a um dos extremos; o outro, que fica na parte posterior da armação, denomina-se pregador e é o lugar onde se fixa a urdidura, que dai se vai desprendendo, gradativamente, a maneira que a teia cresce. Depois vem os lisses, que suspensos por cordinhas em roldanas seguras às travessas de cima, por um movimento das premedeiras ou pedais sobem e descem verticalmente, fazendo cruzar os fios da urdidura, que se lhe prende às extremidades de baixo, nas suas telas duplas. O pente é também uma das peças principais do tear; compõe-se de uma espécie de grossos sarrafos em quadro e prende-se no alto das duas travessas superiores, num entalhado que aí existe, de modo a dar-lhe mobilidade ao menor impulso, pois que às mãos do operário a sua função é apertar a trama na urdidura, após o passar da lançadeira. Segue-lhe a travessa onde o tecelão apoia o peito, quando em actividade, sentando ao tosco banco que corre à frente do tear em toda a sua largura.
O aparelho era manipulado pela mulher, que era quem desde tempos coloniais se ocupava na indústria têxtil.
Colocada e ajustada a urdidura que se enrola no cilindro posterior e se fixa no da frente, depois de passar pelos dois lisses e pelo pente ou batedor; preparada a lançadeira – espécie de canoinha, que os franceses chamam navette com os carretéis onde se envolve a trama, a tecelã senta-se a frente do aparelho, no banco, e, com os pés nas premedeiras movimenta o mecanismo, fazendo baixar um lisse enquanto o outro se ergue formando então os dois panos da urdidura um parale-lograma, por onde corre a lançadeira que é jogada destramente, – após o que o pente bate forte a trama, numa primeira pancada ritmada e seca, logo em seguida outra, e outra, e muitas outras, que ecoavam pelo sitio durante dias inteiros...”

O aparelho em que se teciam, em toda a Ilha, toalhas, colchas, riscados e tantas peças de algodão tão comuns, é o tear rectangular, que apareceu evolutivamente logo depois do tear vertical. Antes, porém, do aparecimento dessa espécie de engenho tecia-se à mão.
Mas o tear, actualmente, apesar de arcaico e em desuso, representou para o habitante ilhéu uma grande conquista no ramo da tecelagem tempos atrás, tanto que, apesar de todos os progressos realizados neste sentido, se perpetuou, por todos os cantos.
Usa-se mais o tear horizontal, de pedal. Descrever um tear é tarefa complicada, deixemos para outra informação específica. Contudo, uma parte importante para se realizar o tecido é o número de liços usados conforme a padronagem que se quer obter. O pente por onde também correm os fios da urdidura aperta o fio repassado.
O tear tipo rectangular, que era armado sempre nas casas em um compartimento de chão, era encontrado em todas as freguesias e arraiais da Ilha.

Em frente a um dos órgãos há um assento para a tecedeira conhecido pelo nome de sedeira. Logo a seguir, ao alcance da mão, está a queixa, um rectângulo de madeira que emoldura o pente, ou seja uma série de taliscas de cana dispostas em forma de pente que dão passagem aos fios da tecedura.
Os órgãos são accionados por umas alavancas, as chaves dos órgãos, que se vão metendo nuns encaixes e que os obriga a dar um quarto de volta. A chave do órgão que fica próximo à tecedeira não chega a ter um palmo e a do que lhe fica oposto é constituída por um pedaço de madeira de forma cilíndrica, com pouco mais de meio metro de comprimento e que está pousada sobre a mesa do lado direito.
Quando se torna necessário movê-lo a tecedeira encaixa uma das extremidades num orifício do órgão e fá-lo dar a volta necessária.
Pendentes da travessa central do rectângulo superior que liga os quatro paus verticais da armação do tear, há dois moitões – os fradinhos – que por sua vez suportam, cada um deles uma pequena travessa – os balancinhos ou cachorrinhos – que se vão prender, por meio de cordões, aos dois liços que trabalham alternadamente em sentido vertical e paralelo.
Os liços, inteiramente feitos de fios de algodão, estão seguros na parte superior e inferior por umas réguas. Para os manter sempre direitos, nas réguas inferiores há dois paus roliços a que chamam trambolhos.
O movimento dos liços é feito por dois pedais premedeiras que trabalham alternadamente e que a eles se prendem por duas cordas chamadas tamissas.
A teia depois de urdida na urdideira, é colocada no tear a partir do orgão de trás, passa pelos liços e segura-se nos órgãos por meio das composteiras, ou sejam umas réguas de madeira que se amarram neles.
Colocada e ajustada a urdidura que se enrola no cilindro posterior e se fixa no da frente, depois de passar pelos dois lisses e pelo pente ou batedor; preparada a lançadeira – espécie de canoinha, que os franceses chamam navette com os carretéis onde se envolve a trama, a tecelã senta-se a frente do aparelho, no banco com os pés nas premedeiras movimenta o mecanismo, fazendo baixar um liço enquanto o outro se ergue formando então os dois panos da urdidura um paralelo grama, por onde corre a lançadeira que é jogada destramente, – após o que o pente bate forte a trama, numa primeira pancada ritmada e seca, logo em seguida outra, e outra, e muitas outras, que ecoavam pelo sitio durante dias inteiros.

O TEAR E OS SEUS ACECESSÓRIOS

Assim é que encontramos nas casas das tecelãs os implementos para a fiação e tecelagem todos rústicos e toscos, de fabricação doméstica.

Mesas – Duas peças de madeira, sobre as quais se fixam todas as outras (fig. 1).
Órgãos – Duas peças que se introduzem nos orifícios existentes nas faces interiores das mesas (fig. 2).
Travessas – Quatro réguas que servem para fixar as mesas nas partes superior e inferior (fig. 3 e 4).
Queixa – Formada por quatro réguas de madeira, que serve para fixar o pente (fig. 5).
Pau da queixa – Pau roliço que serve para manter suspensa a queixa (fig. 6).
Pente – Peça construída por uma série de pequenas espátulas de cana (puas) colocadas verticalmente com as faces em sentido contrário ao comprimento do pente (fig. 7). As puas agrupam-se às seis e a cada conjunto de doze puas chama-se cabrestilhos. Há de 14, 42, 45 e 58 cabrestilhos.
Liços – Duas réguas de madeira a que se ligam vários fios, em forma de arca e que servem para abrir ou fechar mais a tela (fig. 8).
Trambolho – Paus delgados e roliços que servem para fazer a ligação entre os liços e as premedeiras (fig. 9).
Cabritos – Paus delgados e roliços que servem para os ligar os liços às corretanas (fig. 10).
Corretanas – Roldanas vulgares que, suspensas de um pau roliço colocado sobre a parte superior das mesas, facilitam o movimento dos liços, que lhes são ligados por intermédio dos cabritos (fig. 11).
Pau das corretanas – Idêntico ao da queixa (fig. 6).
Premideiras – Peças de madeira em forma de pedais que se ligam trambolhos (fig. 12). O número de Premideiras é igual ao dos liços que se utilizam.
Canas de encruzo – Duas canas vulgares que se enfiam na teia, entre o orgão e os liços, que fazem com que os fios se cruzem duas vezes.
Peso – Pedaço de ferro ou chumbo, preso por um cordel às canas do encruzo e suspenso do orgão dianteiro. Usam como pesos uma ferradura, empregada como amuleto.
Chave do órgão – Pau torto que se introduz num dos furos do orgão da frente (fig. 13). A chave para o orgão de trás é em ângulo recto (fig. 14).
Tempereiros – Peça dupla de madeira que contém nos extremos uma parte de ferro provida de dentes miúdos e que serve para esticar o pano no sentido da largura (fig. 15).
Tábua de encosto ou cedeira – Tábua larga que se fixa na parte traseira das mesas, na qual se senta a tecedeira (fig. 16).
Lançadeira – Peça de madeira em forma de barquinha, que serve para conduzir a canela (fig. 17).
Canela – Canudo de cana delgada onde se enrola o fio e se introduz na lançadeira (fig. 18).
Broca – Pequena haste flexível que se fixa a canela à lançadeira.
Compostoros – Réguas de madeira que se amarram ás pontas da teia por cabrestilhos (fig. 19).
Linhadouros – Cordões que servem para ligar os compostouros aos órgãos.

Como acessórios do tear temos:
a)Escaroçador (descaroçador): Numa banqueta rectangular sobre quatro pés, instalam-se dois montantes verticais, entre os quais se colocam conjugados dois cilindros horizontais, munidos de manivelas.
Operação: Uma pessoa (sempre criança é que se encarrega desta etapa) de cada lado vai colocando o "capucho" (capulho) de algodão, como foi colhido, de um lado, entre as moendas. Com o movimento que se dá às manivelas, solta-se a polpa, que cai do outro lado, restando cá os caroços. O algodão está descaroçado.

b)Cardas: As cardas são duas pequenas pás munidas em uma de suas faces de uma espécie de escova de pontinhas de aço, bem juntas, cobrindo toda a área da pazinha. Utiliza-se para se limpar as impurezas da Lã, para se transformar em fio, deverá passar pelo processo de cardação, que é o ato de desfiar e pentear, para a mesma direcção, as fibras da lã de ovelha. As cardas mais usadas, ou melhor, as que conhecemos são de procedência inglesa.

Operação: Colocam-se pequenas porções de lã descaroçada na carda, previamente aberta com a mão, recobrindo-a inteiramente.
Com a segunda carda vai-se escovando essa lã, de modo que as duas cardas se encontrem voltadas para sentidos opostos, quantas vezes for necessário, de maneira que a impureza, que continha a lã, se separe, resultando uma pasta fofa e limpa. até obter-se fibras agrupadas de tal forma que facilitam a fiação. O processo de abrir a lã com os dedos ajuda ao mesmo tempo a desembaraçar as fibras e a eliminar parte das impurezas que ainda ficaram.

c)Fuso e Roda (roca): São desnecessárias descrições deste dois implementos, pelo muito que são conhecidos. Da pasta limpa como pluma, no fuso ou na roda se transforma em linha a lã cardada.

d)Dobadoura (Dobradeira) – É um engenho para se transformar as meadas a linha fiada e enovelada. Ela compõe-se de uma cruzeta de madeira servindo de suporte para uma haste fixa verticalmente. Na extremidade de cima dessa haste, coloca-se outra cruzeta móvel (que gira na haste, que é um eixo), tendo em cada ponta uma vareta vertical (30 cm).

Operação: Amarra-se a ponta da linha em uma das varetas, e com um impulso com a mão faz-se girar a cruzeta, e o fio sai do novelo e se envolve na dobadoura.
A meada deve ser frouxa para ser tingida, recebendo o corante de forma igual. Para se tecer o "guingau" (um padrão de tecido), toma-se a meada, isola-se uma parte, tingindo apenas a outra. Assim o fio fica com dois tons diferentes.

e)Casal - Caixa com doze divisões para outros tantos novelos, cujos fios depois de passados pelos seis furos de uma régua de madeira, – a espadilha – seguem para a urdeira a fim de formar a teia.

f)Espadilha – régua de madeira, em forma de espada, com 12 orifícios onde se introduzem os fios para a urdidura (fig. 22).

g)Urdideira – Constituída por quatro paus formando rectângulo, com toros de madeira onde se amarra a urdidura, usada como suporte de medida para preparar os fios do urdume (medir, cortar) destinados a dividir os fios antes de estes passarem à teia (fig. 20)

h)Restelo: Peça estreita e comprida, de forma rectangular com duas réguas de madeira, uma das quais tem um número de toros igual ao máximo dos cabrestilhos que a teia possa ter, e a outra os orifícios correspondentes (fig. 23). Serve para distribuir a teia no orgão do tear. Aos fios que passam no Rastelo chamam cabecilhos ou cabrestilhos.

i)Passaricos: (na Ribeirinha espichos) – pedacinhos de cana que funcionam como lançadeiras, onde se enrolam tiras de pano de algodão amarrados entre si e que se destinam a entrelaçar em certos tecidos caseiros Canelinhas (canilhas, espécie de carretel): São pequenas hastes que se encaixam nas canoinhas. O nome se deve à aparência que tem com um osso de canela (fina no meio e extremidades arredondadas). Dizem que antigamente se usavam mesmo os ossinhos, mas hoje o material usado é o gomo do bambu.

j)Lançadeira (Navete ou Canoinha): Toda de madeira, é constituída por duas peças: a broca, a caixa oval sem tampa e a canela que está metida na broca.
As lançadeiras são mesmo em forma de canoinhas de madeira, usada para colocar o fio de trama que irá passar no meio da cala, onde se colocam as canelinhas com o fio colorido formando a trama do tecido para se fazer o tapume ou o repasse.

Operação: A canoinha com os fios de tapume é lançada entre os fios da urdidura, que são passados entre os dentes dos liços e do pente. Os pedais levantam e abaixam os fios da urdidura para dar passagem ao fio do tapume e compor o desenho ou "repasse".

k)Tear de Franjas

l)Roca: A lã depois de desfiada ou cardada está pronta para a fiação.
Fiar é torcer ou reduzir a fio qualquer matéria filamentosa. Faz-se alongando e retorcendo suas fibras. É a torção que confere ao fio resistência à tração, pois faz com que as fibras se apertem umas contra as outras.
Uma vez fiado, o fio é retirado e enrolado manualmente ou com uma máquina própria, ou enrolado na meadeira fazendo meadas para o tingimento.
Em todos os métodos as mãos desempenham função importante.

Operação: Com uma das mãos segura-se a lã cardada e com a outra movimenta-se a lã já determinando a espessura. Para fiar podemos usar vários métodos:

m)Tear de Franjas

n)Meada

o)Lanceta – Pequena espátula de cana que facilita a passagem dos fios através das puas quando se repassa a teia.

p)Caneleira – Pequena máquina construída por uma base com duas hastes e um fuso com roda, que serve para enrolar o fio nas canelas (fig. 24).

q)Caixa das Canelas – Caixa onde se guardam as canelas cheias.

r)Vara – Régua de madeira, com cerca de 1,25 m de comprimento, com a qual faziam as medições. Antiga medida linear.

TRABALHOS PREPARATIVOS DA TECELAGEM

Tudo começa com a tosquia das ovelhas, passado o Inverno geralmente nos meados da primavera, sendo o velo (lã) enrolado em feixe e arrecadado até ao Inverno, altura em que se prepara a lã que se faz no verão. A lã é lavada com água e sabão para lhe tirar a gordura.
A lã para ser utilizada tem que ser amolecida em água quente, de um dia para o outro, para, em seguida, ser lavada em água fria, geralmente este trabalho era realizado nos regatos ou ribeiros, e batida, antes de secar ao sol.

Depois de seca ao sol é toda aberta à mão e a seguir escarduçada. À medida que se vai tirando das cardas, é posta em camadas, ou como se diz na terminologia indígena, vai sendo imprimida, acto que consiste em pôr os diversos montinhos de lã uns sobre os outros sem os calcar, de forma a ficar o mais solta possível para os trabalhos de fiação.
Muitas vezes a arte de fiar era realizada à noite à luz de um candeeiro de petróleo, que por via de regra redundam numa autêntica festa regional em virtude de a eles assistirem muitos rapazes e raparigas que bailam e cantam as canções regionais e comem milho cozido, prato obrigatório nestas reuniões a que o povo da Ilha dá o nome de fião.

Antes de se começar a fiar, enrola-se um papel no cabo do fuso, para depois, quando cheio, se poder tirar facilmente a lã fiada que sai num corpo só de forma oval, e a que chamam a massaroca. Em seguida a lã é passada ao sarilho para fazer as meadas e deste à dobadoira para fazer os novelos.

Para executar qualquer tecido há cinco operações a realizar:
a)Urdir a teia;
b)Deitar a teia no tear;
c)Repassar;
d)Tecer;
e)Operações complementares (soltar os órgãos, desenrolar o pano, arrematar os fios que ficam soltos e separar os tecidos confecionados).

Na Terceira, em tempos idos, a tecelagem atingiu um alto grau de perfeição de tal maneira que a Câmara Municipal, para não deixar perder tal mérito, deliberou conforme posturas municipais, proibir que usasse do ofício quem não possuísse carta de exame passada pela referida Câmara.

ESPÉCIES DE TECIDOS FABRICADOS NO TEAR CASEIRO

São vários os tipos de tecidos e segundo um trabalho de Luís Ferreira Drumond, os principais panos fabricados na nossa Ilha eram a fiampua e a teia cheia.

Fiampua – O nome dado a esta espécie de tecido, parece ter a sua origem no facto de, para o seu fabrico, ter de se fazer passar apenas um fio por cada pua do pente.

Um fio em cada pua
Um fio em pua
Fio em pua
Fiampua
Este tecido utilizava-se geralmente para confecção de mantas, toalhas, passadeiras de retalhos, cobertores de fios, aventais e panos de cozinha e de um modo geral todos os panos grosseiros.
As tradicionais mantas de farrapos, coloridas e ingénuas, que em tempos eram fruto de uma imaginação distante que nas horas de invernia puxavam o tear que ia alimentando o órgão, são agora procuradas para decoração dos espaços habitacionais.
A fiampua era urdida com fio de linho ou de algodão e tapada com lã, algodão ou retalhos de diversas fazendas usadas, que se desfiavam, cardavam e tornavam-se a fiar.

Teia cheia – Nesta espécie de tecido, o espaço compreendido entre duas puas do pente levava dois fios.
Utilizava-se para a confecção das colchas regionais, pano de meio três, pano da terra e pano de linho.
As colchas eram urdidas com fio de algodão e tapadas com fio de lã e outro de algodão; o meio três, com linho ou algodão tapado com lã; os panos da terra eram urdido e tapado com lã; e o linho, só com linho.
Há relativamente poucos anos fazia-se um tecido branco, urdido com linho ou estopa e tapado com algodão, com que se faziam as camisolas de pastor, também conhecidos por camisolas de leiteiro, pelo facto de há anos atrás, ter sido imposto a obrigatoriedade do seu uso aos homens que vendiam leite pelas portas, presentemente apenas usadas pelos pastores que vão à corda das nossas tradicionais touradas.
Também se empregava na confecção de roupas interiores, principalmente para homens.

DESENHOS

Os tecidos são feitos sob desenhos chamados "repasse". Os nomes dos desenhos são variados e conhecidos entre as tecelãs, (como: caramujinho, laranja partida, trem de ferro, chocalho de cascavel, guingau e muito outros).
As receitas são conservadas e reproduzidas em tiras de papel, onde se vêem pequenos traços verticais, agrupados de espaço em espaço, em números diferentes. Sua leitura é indecifrável para o leigo. Pelos riscos ou traços, pontos e círculos, não se pode ter uma ideia do desenho que vai sair dali.
A partir dos repassos constroem-se os desenhos das colchas, cobertas e tecidos e propõe a construção inversa, isto é, a partir do desenho a construção do repasso. Mesmo não sendo o objetivo deste trabalho, é necessário esclarecer alguns termos que fazem parte dessa profissão. Uma das palavras que utilizaremos é repasso. Repasso nada mais é do que a escrita utilizada pelas tecelãs que observando-o detalhadamente ela visualiza o padrão ou estampa da coberta.
O fazer repetitivamente um repasso para uma determinada colcha ou coberta pode intuitivamente memorizar a receita e é claro identificá-la à primeira vista.
Mas o que leva uma tecelã/tecedeira, ao olhar qualquer repasso identificar as figuras geométricas que se produzirão ao confeccionar tais objectos artesanais?
Para se perceber melhor do que estou a falar produzo abaixo um repasso simples. Esse repasso foge a nossa compreensão do ensino escolar tanto quanto foge para a tecelã a compreensão das fórmulas utilizadas na matemática. O ambiente em que vivem estes dois grupos sociais – os tecelões e os matemáticos – os conduzem à interpretação de mundo diferenciada a ponto de desenvolverem escritas /representações/ símbolos próprios dos grupos aos quais pertencem e somente as pessoas pertencentes a esses grupos são capazes de interpretá-las e compreendê-las.
Vejamos agora o desenho que se forma na colcha, na manta ou no cobertor com a escrita acima enunciada.
Gostaria que o leitor tentasse pensar a partir de agora: qual o processo de passar essa escrita para um papel quadriculado ou para o sistema cartesiano e perceber como o tear trabalha e como a escrita acima produz o desenho abaixo.

Este desenho, sendo colocado ao lado de figuras de mesmo padrão forma um mosaico de beleza única.
Portanto, o repasso é a receita do tecido de flor dado ou de repasso, ou
seja, do tecido estampado. Os campos de conhecimento, o linguajar, a leitura, as ferramentas e a técnica são diferentes, mas isso não significa que um conhecimento seja desqualificado em relação a outro, pois ambos produzem algoritmos próprios para chegar à solução de seus fazeres.
Para dar continuidade exporei alguns dos dados colectados na tecelagem das tias Violantes, mulheres que teciam com a urdideira de parede, com liços de quatro folhas feitos de pequenos pedaços de barbante, com tramas que passam através de canelinhas finas e feitos de casca de bambu e cujo pente é uma peça rectangular formada de finas lascas de bambu firmemente amarradas entre quatro barras de madeira leve.
Os tipos de tecidos são determinados pela programação dos fios do urdume, na urdideira, pela distribuição destes fios nas folhas de liço e no pente, e finalmente pela maneira de pisar na espremedeira (pisadeiras). Os repassos são representados por quatro linhas paralelas que correspondem no tear a uma folha de liço, que por sua vez, está ligada a uma espremedeira. Cada traço vertical representa a casinha da folha de liço por onde deverá passar um fio da urdidura. O trabalho está acrescido do ritmo que a tecelã impõe no seu trabalho.
Não apresentarei todos os repassos para que este artigo não se alongue e fuja do seu objetivo. Seleccionei um entre os colectados para que nos ajudem a compreender conceitos matemáticos nele inseridos.
Começamos pelo repasso chamado “esteira grande”

Para se poder entender, pensei nos gráficos das relações de conjunto e na teoria de conjuntos. Pelos fatos das linhas colocadas serem perpendiculares ao pente, imaginei o sistema cartesiano. O tempo foi fazendo-me perceber que eu deveria trabalhar linha a linha na construção do desenho. Na primeira linha eu tenho a seguinte orientação:

1ª e 4ª linha = cor do fio utilizado (neste caso, o vermelho)
2ª e 4ª linha = fio de outra cor (neste caso, cor branca)
1ª e 3ª linha = fio de outra cor (neste caso, cor branca)
2ª e 3ª linha = fio de outra cor (neste caso, cor branca)

Já na segunda linha observo que a cor vermelha ficará no local onde os risquinhos estão no segundo sinal do repasso. Neste caso eles estão na segunda e quarta linhas, logo em todos os lugares que têm os risquinhos na segunda e quartas linhas teremos a cor vermelha e nos demais o branco. Portanto seguindo este encaminhamento, percebemos que a sexta linha do desenho abaixo tem no repasso os risquinhos na primeira e terceira linha do repasso, logo o vermelho cairá nesta posição.
Esse processo é o mesmo para todos os trabalhos de tecelagem de quatro pisadeiras. Por mais simples que pareça a explicação, a reconstrução das intersecções, das relações existentes não são vislumbradas tão de imediato e mesmo que fizéssemos alguns exemplos teríamos muita dificuldade em vislumbrar a obra no seu término só olhando o repasso.
O mesmo jeito de fazer, desde o colocar dos fios nas urdiduras e no pente, seguindo o repasso poderá produzir o seguinte risco.

A tecedeira desconhece os algoritmos da matemática elementar ou outros conceitos que se aprendem nesta disciplina escolar, mas ela sabe colocar os pontos com seus pés, mente e mãos construindo uma peça de utilidade doméstica ou pessoal. Ela tem de saber utilizar as pisadeiras, colocar o fio no local certo, ter um ritmo, conhecer bem a força que deve dispor para o tecido sair perfeito.

http://www.folclorico-ribeirinha.com/index.php?op=14

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